Quando finalmente resolveu comprar aquela cama
box tão desejada para o apartamento novo, Karina Lanfredi nem imaginava estar
ingressando em um campo de batalha. Na loja, uma franquia da Ortobom no
Shopping Iguatemi, o atendimento foi impecável: uma pequena entrada,
parcelamento em cinco vezes sem juro e a promessa de pontualidade na entrega.
Ao término da visita, os cheques estavam assinados.
— A entrega estava marcada para 10 de
janeiro. Meu marido faltou ao trabalho para esperar. Quando cheguei em casa, vi
a cara dele, frustrado porque o colchão não havia chegado, nem tinham
telefonado para avisar. Senti aquele frio na barriga de que alguma coisa estava
errada — diz Karina.
Durante três dias, ligou
para a loja atrás do vendedor ou do gerente, ambos nunca disponíveis. Pedia que
telefonassem de volta, mas seu celular insistia em não tocar. Uma semana
depois, foi pessoalmente ao local. Irritada com a falta de informações, queria
cancelar a compra e receber de volta o valor dado como entrada, cerca de R$
450. Falou rapidamente com o gerente, que prometeu telefonar com uma solução. E
dessa vez ligou.
— Mas, para minha
surpresa, não queria se desculpar ou combinar o cancelamento da compra. Dizia
que eu teria que receber o colchão de qualquer maneira, caso contrário iria me
notificar judicialmente. Nem acreditei no que ouvia — revolta-se.
Seu passo seguinte foi
sustar os cheques — desde janeiro, eles batem na sua conta no dia exato do
vencimento e são bloqueados pelo banco. Agora, a situação inverteu: a empresa
liga semanalmente para Karina querendo entregar a cama box, mas ela não aceita.
O caso foi parar no Procon de Porto Alegre, e ainda está sem acordo.
O caso de Karina — que
continua dormindo na cama velha — dá uma ideia das situações com as quais
clientes ainda se deparam ao comprar móveis, eletrodomésticos ou eletrônicos no
Brasil. Embora o país tenha uma das legislações mais avançadas do mundo sobre
relações de consumo, embates em razão de problemas em entrega, troca ou reparo
se proliferam. Em 2013, 2,4 milhões de reclamações chegaram aos Procons do
país, segundo a Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça, um
acréscimo de 22% em relação a 2012. No mesmo período, as vendas do comércio
cresceram 4,3%.
— A maioria das grandes
redes parece visar apenas à venda imediata, deixando em segundo plano a
fidelização do cliente. Não há no país uma relação amigável entre cliente e
empresa, e isso tem levado a uma quantidade enorme de casos de desrespeito aos
direitos do consumidor — analisa Flávia do Canto Pereira, diretora-executiva do
Procon de Porto Alegre.
O galope nas reclamações levou o Senado a
aprovar no último dia 26 um relatório que determina mudanças no Código de
Defesa do Consumidor (CDC), em comissão temporária criada para atualização das
normas. As mudanças ainda precisam passar pelo plenário antes de seguirem à
sanção presidencial.
Se aprovadas, as
mudanças podem dar mais poder aos Procons, atribuindo a eles fiscalização na
oferta de crédito e oferecendo condições para inibir abusos na internet. Também
está em debate a autonomia dos órgãos para aplicar medidas corretivas, como
determinar substituição de produtos estragados ou multar empresas que
descumpram prazo de entrega para clientes.
O que diz a Ortobom
A Colchões Ortobom
comunicou que irá orientar o franqueado sobre a melhor prática de prestação de
serviços aos clientes. A empresa informou que está à disposição da consumidora
para efetuar a devolução do valor do produto e enviou contatos para que Karina
resolva a situação com agilidade